Informação e consentimento

Os requisitos relativos à provisão de informação e consentimento para estudos são uma das formas em que o sistema regulatório atua para desmotivar, em vez de incentivar, a pesquisa para tratar de incertezas sobre os tratamentos. É importante, e ético, considerar os interesses de todos que atualmente estão recebendo tratamento, não apenas os poucos que participam de estudos controlados. O padrão para consentimento livre e esclarecido dos tratamentos deve, pois, ser o mesmo se as pessoas estão recebendo a proposta de tratamento dentro ou fora do contexto de avaliações de tratamento formal. Para chegar a uma decisão que está de acordo com os seus valores e preferências, os pacientes devem ter tanta informação quanto desejarem e no momento em que a desejarem.

Quando há tratamentos a serem propostos ou prescritos na prática cotidiana, é aceitável que as pessoas tenham preferências e demandas individuais diferentes, que podem mudar com o tempo. Também se reconhece que as pessoas podem variar não somente na quantidade ou tipo de informação que desejam, como também na sua capacidade de entender toda a informação no tempo que têm disponível e no seu grau de ansiedade e medo. Os profissionais de saúde são incentivados a ajudar os pacientes a fazerem escolhas sobre os tratamentos de forma responsiva e sensível ao que cada indivíduo deseja em um determinado momento.

Na pesquisa, porém, o fornecimento de informação a potenciais participantes é supervisionado pelas agências regulatórias, que muitas vezes insistem na divulgação mais completa possível de toda a informação relevante, no momento em que as pessoas estão sendo convidadas a participar dos estudos. Isso pode desnecessariamente irritar, frustrar ou assustar aqueles que preferem “deixar isso para o médico”, ou pode levantar preocupações desnecessárias.

O ensaio clínico da cafeína em bebês prematuros que mencionamos no Capítulo 5 fornece uma ilustração vívida de como prejuízos podem ser causados pela insistência de que a informação mais completa possível seja fornecida aos candidatos a pesquisas. O estudo da cafeína recrutou mais de 2.000 bebês prematuros por todo o mundo, mas levou um ano a mais do que o esperado, porque o recrutamento para o experimento foi lento, particularmente no Reino Unido, onde vários centros desistiram por causa dos atrasos regulatórios no processo de aprovação. Consequentemente, o Comitê de Ética em Pesquisa insistiu
que os pais fossem informados de que a cafeína poderia causar ataques em bebês, quando essa complicação tinha somente sido constatada após uma overdose de dez doses. Então, os pais estavam sendo confrontados com informação aparentemente assustadora, que eles provavelmente não precisavam saber – e não saberiam –, que a cafeína poderia ser usada como parte do tratamento de rotina.

Existe pouca evidência de que as formas amplamente promovidas de regulação em pesquisa são mais benéficas do que danosas. De fato, seja qual for a evidência existente, ela é perturbadora. Por exemplo, nos estudos que avaliam os efeitos de tratamentos que têm de ser administrados sem atraso, exigindo que o “ritual” do consentimento livre e esclarecido por escrito seja observado, pode resultar em mortes evitáveis, bem como subestimar os efeitos dos tratamentos. A obtenção do consentimento é uma intervenção de saúde pública que pode ser mais prejudicial do que benéfica. Como outras intervenções bem intencionadas, os seus efeitos devem ser avaliados rigorosamente. As consequências fatais que descrevemos poderiam ter sido identificadas há décadas se a comunidade de ética em pesquisa tivesse aceitado a responsabilidade de fornecer evidência sólida, demonstrando
que as suas “prescrições” podem fazer mais bem do que mal.

Uma abordagem flexível ao fornecimento de informação para potenciais participantes de pesquisas reconhece que a confiança entre médico e paciente é o fundamento de qualquer consulta satisfatória, sendo melhor do que uma abordagem padronizada rígida. Mas, por causa do modo como os sistemas regulatórios intervêm na pesquisa, os médicos não são atualmente livres de escolher de que forma explicar as pesquisas para os pacientes. Além disso, muitas vezes eles acham difícil falar sobre as incertezas inerentes à pesquisa.

Por exemplo, como mencionamos no Capítulo 5, os médicos que recrutam pacientes para ensaios clínicos sentem-se frequentemente desconfortáveis dizendo: “Não sei qual o melhor tratamento”, e os pacientes muitas vezes não querem escutar isso. Os médicos e os pacientes precisam mesmo de melhor apreciação das incertezas e melhor compreensão dos motivos pelos quais a pesquisa é necessária (ver Capítulo 11).